Interpretar

Sobre as imagens radiográficas e fotográficas na relação Dentistas e Convênios – Análise da Resolução CFO 102/2010

Marco Aurelio Fernandes dos Santos

Gerente de Sinistros / Professor de Auditoria & Consultoria / Advogado Direito Médico / Cirurgião Buco Maxilo

Desde quando inauguramos nosso Curso de Auditoria Odontológica & Consultoria de Rede, nos idos de 2015, vimos reiteradamente comentando em aula o conteúdo da Resolução 102 do Conselho Federal de Odontologia, de 2010, agora tão em voga nas redes sociais. Desde quando a aludida Resolução foi publicada, até hoje, nada mudou em termos de sua interpretação, não tendo a mesma sido alterada ou revogada por nenhum outro ato legislativo.

Cabe aqui um comentário inicial: a Resolução é uma norma, vez que emitida por um órgão com poder normativo que é o CFO. Em sendo norma, está sujeita à interpretação.

No meio jurídico, costuma-se dizer que ela é somente um texto normativo, estagnado, à espera de um fato concreto que o desencadeie para que nasça, para que emerja para o mundo jurídico, após adequada interpretação. Isso mesmo: enquanto ali escrita, é somente um texto, e portanto sujeito à pura interpretação gramatical.

Natural que as pessoas façam interpretações gramaticais das normas, pois faz parte do aculturamento do ser humano, prática essa vinda desde os bancos escolares no nível fundamental.

Ocorre que a Resolução 102/2010 vem sendo erroneamente interpretada, mesmo que o seja sob o ponto de vista gramatical. Senão vejamos.

A Resolução é curta, tem somente dois artigos, que seguem na íntegra:

 

Art. 1º. Fica vedado o uso indiscriminado de Raio X com finalidade,

exclusivamente, administrativa em substituição à perícia/auditoria e aos

serviços odontológicos.

Art. 2º. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação na

Imprensa Oficial, revogadas as disposições em contrário.

Vírgula, pra que te quero?

Muitos atos normativos são imperfeitos, carecem de técnica adequada, e a Resolução não escapou desse destino. Talvez no afã de dar ênfase ao termo “exclusivamente”, o legislador andou mal ao apor uma vírgula entre o termo “finalidade” e o termo “exclusivamente”, o que ocasionou uma dificuldade de interpretar o artigo, ainda que gramaticalmente, no art. 1º.

Sem ter o intuito de ser portador da verdade absoluta, atrevo-me a reescrever o texto legal com a correta aposição de vírgulas. Teríamos então o seguinte texto, que já começa a aclarar sua interpretação:

Art. 1º. Fica vedado o uso indiscriminado de Raio X com finalidade

exclusivamente administrativa, em substituição à perícia/auditoria e aos

serviços odontológicos.

Art. 2º. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação na

Imprensa Oficial, revogadas as disposições em contrário.

Bastou excluir uma vírgula e posicionar a outra após o termo “administrativa” que já temos um texto muito mais claro e intelegível.

De toda forma, mesmo superado esse vacilo gramatical, a Resolução não tem sido bem interpretada. Não raro encontramos vozes ecoando que tal Resolução proíbe que convênios exijam radiografias. Não é esse o intuito da norma. Esse tipo de entendimento não consegue prosperar nem mesmo que se faça um grande esforço de interpretar o texto. A Resolução veda sim o uso de RX, mas faz três importantes ressalvas que passaremos a comentar a seguir:

1.    Fica vedado o uso indiscriminado de RX. O termo “indiscriminado” significa que o uso teria que ser confuso, desordenado, incontrolado, indiferenciado. Exemplo prático seria na hipótese de se fazer uso de RX para casos a esmo, sem uma lógica definida, o que em termos vulgares seria usar radiografia “a torto e direito”, algo como fazer uso à toa, às cegas, em excesso, em demasia.

2.    Mais um critério deve ser preenchido para que o uso de RX seja vedado, quer seja, essa utilização deve ter finalidade exclusivamente administrativa. Toda vez que se faz um exercício interpretativo legal, deve-se levar em conta o que em latim se diz “mens legislatoris”, e se traduz pelo pensamento, a vontade, a intenção do legislador. O elaborador da lei provavelmente quis separar dois mundos, o clínico e o administrativo, e por isso fez a redação dessa forma. 

Com isso quis dizer: se não há indicação clínica, o uso de RX fica vedado. Tal interpretação flui muito bem se, a título de exemplificação, a Operadora de Saúde solicita radiografia para se constatar a radiopacidade de um grampo metálico de uma prótese parcial removível, com o único intuito de certificar-se de que tal prótese foi instalada na boca do paciente. Não obstante, dá-se muio conteúdo para discussão se a solicitação for de radiografia após um procedimento de exodontia. 

Ora, neste último caso não se descarta indicação clínica, visto que o sucesso (remoção do elemento dental na integralidade) não depende exclusivamente do campo visual do cirurgião, podendo este ter que recorrer a um exame radiográfico, visto que pode encontrar surpresas, como fragmento radicular intra-alveolar, esquírolas ósseas, fraturas ósseas. Evidente que neste caso não se pode falar de uso exclusivamente administrativo.

3.    O legislador pretendeu ainda vedar o uso indiscriminado de RX para substituir a perícia ou auditoria. É provável que o redator da Resolução estendeu seu pensamento a uma esfera que não conseguiu transmitir com a redação do texto legal, o que nos leva a um esforço interpretativo incondizente com a boa técnica jurídica de extração do significado e do alcance da norma. 

Explico-me: ao usar a vedação nos casos de “substituição de auditoria/perícia”, o legislador provavelmente quis se referir à auditoria clínica ou externa, modalidade pouquíssimo utilizada por Operadoras Odontológicas. Em outras palavras, o legislador quis dizer que se a Operadora não for utilizar a auditoria externa (que envolve exame físico do paciente), não poderá solicitar radiografias substituindo tal exame presencial. 

Não fosse essa a intenção do legislador, não teria usado o termo “substituição”. Oras, nos casos de auditoria interna, realizada dentro das dependências da Operadora, sem a presença do paciente, as radiografias são utilizadas para compor a auditoria, não para substituir. O legislador somente proibiu o uso de Rx para substituir a auditoria, e isso as Operadoras Odontológicas não o fazem, nada substituem, mas executam auditoria.

Do todo exposto, lícito concluir que a Resolução 101/2010 veda a utilização de radiografias por parte de Operadoras em casos selecionados, específicos, não se podendo estender a proibição, como querem alguns, a todos os casos da prática clínica na relação prestadores/operadoras.

Adicionalmente, enfatize-se que a Resolução é omissa em relação a imagens fotográficas.

Oportunamente enfrentaremos outros temas relacionados ao papel da ANS neste tema, sendo certo que até o momento nenhuma regulamentação foi elaborada por tal Agência Reguladora, e tudo que se tem são conjecturas e más interpretações sobre o assunto.

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